Medicina Geral de Adultos 2
Gostaria de reagir a esta mensagem? Crie uma conta em poucos cliques ou inicie sessão para continuar.

Manejo do paciente hiperutilizador

Ir para baixo

Manejo do paciente hiperutilizador Empty Manejo do paciente hiperutilizador

Mensagem  mairalmf Dom Mar 10, 2013 11:01 pm

As pessoas que consultam os seus médicos de família com muita frequência e que apresentam uma variedade de sintomas, mesmo com a ausência de uma doença física verificável, têm sido alvo de vários rótulos: "frequent attenders" (Courtney,1974); "hateful" (Groves, 1986); "somatizadores crônicos" (Bass, 1990), "pessoas problemáticas" e "pessoas difíceis".

A simples ocorrência do aumento de consultas em relação a um padrão de referência não deve ser vista como um problema. É essencial distinguir entre um aumento transitório de pedidos de ajuda devido a problemas de saúde físicos, psicológicos ou psicossociais em uma fase da sua evolução, e situações em que, de modo recorrente ou persistente, exista uma procura elevada e aparentemente injustificada de consultas.
Quando a gravidade da doença, a necessidade de reavaliações frequentes e as necessidades das pessoas com doenças crônicas são fatores responsáveis pela procura excessiva de consultas, a frequência de consultas pode ser adequada e não deve ser considerada um problema. No outro extremo, quando a ida frequente à consulta não se traduz em resultados de melhoria das situações de saúde e na redução do sofrimento, é legítimo perguntar se há maneiras melhores para o manejo destas pessoas.

Atualmente, com o aumento do uso dos cuidados da atenção primária e de constrangimentos sobre a duração da consulta, as pessoas que consultam frequentemente são, muitas vezes, fontes de estresse e de frustração para alguns médicos de família.
Em relação aos doentes, existe evidência de que os grandes utilizadores de consultas tendem a ter taxas elevadas de doenças crônicas, sofrimento emocional, doenças mentais e problemas psicossociais. Alguns estudos sugerem maior proporção de mulheres, idosos, desempregados, e de doentes crônicos.

Do ponto de vista do sistema de saúde e da sociedade, destacam-se o desperdício e o uso inadequado e ineficaz de recursos devido às investigações, tratamentos e referenciações inapropriados.
Além disso, o médico, sem perceber, pode cair em um ciclo vicioso e desgastante de repetidas e sucessivas consultas sem resultados positivos, reduzindo o tempo disponível para as pessoas e gerando insatisfação e mal estar para ambas as partes.

Manejo do paciente hiperutilizador Figura1jc



Estas pessoas consomem mais cuidados de saúde e nelas são diagnosticados mais problemas de doenças somáticas e mais problemas sociais, emocionais, psiquiátricos e sintomas físicos clinicamente inexplicáveis. Elas percebem que são rotuladas como inconvenientes ou hipocondríacas pelos seus médicos.

A abordagem das pessoas que consultam com frequência inclui obrigatoriamente o médico como um dos protagonistas em jogo. A sua preparação e competências técnico-clínicas, os seus valores, as suas crenças, os seus preconceitos, a sua carga de trabalho, uma eventual situação de burnout, o seu estilo de abordagem restrito, as suas competências comunicacionais e de construção da relação médico-doente, o seu bem estar físico, psicossocial e socioeconômico, podem ter alguma influência no fenômeno dos hiperutilizadores. Um destaque especial deve ser dado à relação médico-paciente, uma vez que a natureza duradoura dessa relação na medicina de família e comunidade pode levar algumas pessoas a consultarem repetidamente devido à sua necessidade de dependência. Algumas vezes, é o médico que pode ter necessidade de que outros dependam dele, sem ter consciência disso. Em geral, todo o médico gosta de ser procurado e de que os doentes gostem dele. Mas, por vezes, essa atitude pode induzir dependência em algumas pessoas.

Manejo do paciente hiperutilizador Figura21



O feedback (explícito ou implícito) dado pelo médico sobre a adequação da consulta por ser um fator poderoso para influenciar o comportamento de procura de consultas. Os médicos tendem a agir de forma conservadora, às vezes de forma defensivamente, preferindo ver (determinado indivíduo) com mais frequência. A indicação expressa pelo médico, para as pessoas que consultam com frequência voltarem à consulta é fornecida em 30 a 40% das consultas, o que induz consultas subsequentes.
O modelo clínico ideal deve estar centrado na pessoa e, ao mesmo tempo, dar valor ao médico, à equipe de saúde, à relação médico-pessoa, aos aspectos organizativos do sistema de saúde e ao contexto em que tudo decorre.

Algumas estratégias preconizadas para reduzir a procura excessiva são óbvias e representam boas práticas. Antes de mais nada, estas pessoas devem ser identificadas. A frequência das consultas e os intervalos entre elas devem ser identificadas. Em segundo lugar, o próprio médico deve olhar para si próprio e refletir sobre sua prática, competências e estilo de consultam num processo profissional contínuo. O trabalho em equipe e a referenciação interna também podem contribuir para lidar com este fenômeno, quando problemático. Será possível e desejável, em tão, substituir terapias farmacológicas e conseguir uma procura mais adequada de consultas?

Por meio dos estudos publicados conclui-se que: para alguns tipos de pessoas com sintomas psicossociais o médico deve abordar os problemas emocionais e fazer o mínimo de referenciações para evitar o risco de iatrogenia; evitar culpar a pessoa pelo problema e encorajá-la a desenvolver estratégias alternativas para o seu manejo: partilhar informação sobre estas pessoas para outros colegas.

A propósito da descrição de um caso clínico. Matalon e colaboradores, propõem como estratégia de entrevista: escutar de forma empática, enfatizar os elementos positivos e salutogênicos ao longo da vida do indivíduo, além da forma heroica como ultrapassou algumas crises: estimular a avaliação de suas vidas; falar sobre suas emoções e aspectos irracionais legitimando ansiedades, medos e dúvidas; evitar julgamentos. Os autores exemplificam, ainda, como objetivos de intervenção: ajuda a integrar e a reinterpretar os acontecimentos da vida, reconciliando-se com a trajetória pessoal; estimular a refazer a sua história de vida procurando encontrar uma coerência para os sintomas físicos e estresse psicológico na situação particular; ajudar a recuperar a autoestima, a recuperar ou adquirir o controle do seu destino e a percepção do seu “eu”, e a encontrar os recursos, dentro ou fora de si, para encarar os problemas como oportunidades não como ameaça, tornando-se capaz de enfrentar a vida de forma mais saudável.

Manejo do paciente hiperutilizador Figura3pw



A abordagem por outros membros e a promoção da autoeficácia e da autogestão da saúde pela própria pessoa poderão ter impacto nos pacientes e nos profissionais. Informar a pessoa sobre quando consultar e quando recorrer a fontes alternativas de cuidados de saúde primários ou a outros serviços de saúde também pode ser útil. Por exemplo, ensinar as pessoas a medir a própria pressão artéria em casa e capacitar o doente na gestão dos problemas crônicos (empowerment) pode contribuir para a diminuição de consultas desnecessárias e, também, para melhorar o prognóstico das doenças. Encara e tratar o doente como um parceiro, investindo tempo suficiente para uma boa anamnese, incluindo a exploração dos seus medos e preocupações, e uma boa explicação das conclusões do médico, poderá ajudar a pessoa e o médico a compreenderem melhor a situação.

Manejo do paciente hiperutilizador Figura4jpeg


Interpretar, ouvir, perguntar, interpretar, partilhar as interpretações, voltar a perguntar para confirmar a sintonia de entendimentos, voltar a ouvir, reformular, resumir e devolver o resultado desse processo formam uma espécie de motor que movimenta todo o processo da comunicação.

mairalmf

Mensagens : 11
Data de inscrição : 18/11/2012
Idade : 36

Ir para o topo Ir para baixo

Ir para o topo

- Tópicos semelhantes

 
Permissões neste sub-fórum
Não podes responder a tópicos